Meu filho tem sopro no coração, Dr?: " Em uma consulta de rotina no pediatra, ao colocar o estetoscópio no peito da criança, o médico ouve um som diferente. Em vez de o coração fazer o tradicional 'tum-tumtum', produz um ruído que lembra um fole ou água saindo de um cano, por exemplo. Trata-se de um sopro, uma alteração no barulho que o sangue faz ao passar pelo coração e/ou sistema vascular - e é preciso investigá-lo.
Segundo o cardiologista Edmar Santos, da Sociedade Brasileira de Cardiologia (SBC), cerca de 80% dos pequenos têm algum tipo de sopro em um momento da vida. Isso não significa necessariamente que haja doença cardíaca por trás. A maior parte corresponde ao chamado sopro inocente, uma modificação da ausculta do coração que se apresenta em crianças saudáveis, em qualquer faixa etária, principalmente entre os seis meses e oito anos de idade, e na ausência de sintomas importantes de anormalidades no órgão. 'Qualquer ruído escutado com estetoscópio recebe o nome de sopro. Ele pode ser inocente ou patológico. O primeiro não traduz doença e tampouco causa problema ou dor. A pessoa leva uma vida normal, inclusive com atividades físicas regulares. Ocorre que o estetoscópio está cada vez mais sofisticado e capta tudo, inclusive a trajetória do sangue', explica.
O sopro cardíaco inocente é a causa mais freqüente de consultas cardiológicas em crianças. É auscultado em 50% a 80% das crianças normais durante toda a infância e adolescência. Na idade escolar, essa prevalência pode atingir números entre 75% e 90%. Sabe-se que ele é contínuo, tem curta duração, baixa intensidade, localiza-se em uma área pequena, varia conforme a respração e posição da criança e desaparece com o passar dos anos.
As origens ainda não são claras. 'Pode ser decorrente de uma variação no fluxo do sangue por causa de uma febre, anemia ou processos infecciosos. O coração dispara porque os vasos de dilatação ficam mais relaxados. Ele precisa manter a pressão e, para isso, tem que bater mais vezes para conseguir mexer esses vasos. A alteração da ausculta é normalizada com o controle desses quadros', afirma Edmar Santos. 'Também acontece devido ao tamanho do coração da criança, que é relativamente pequeno. O sangue acelera um pouquinho na hora que sai provocando uma turbulência, que pode ser percebida pelo estetoscópio. É um processo normal. A criança cresce, o coração fica no tamanho adequado e não produz mais ruído', esclarece Célia Maria Camelo Silva, coordenadora clínica do Setor de Cardiologia Pediátrica da Universidade Federal de São Paulo (Unifesp).
Cuidados na avaliação
QUE BARULHO É ESSE?
O coração se localiza no meio do peito, ligeiramente deslocado para a esquerda. Ocupa no tórax a região conhecida como mediastino médio.
Constituído por duas estruturas separadas por um septo, uma do lado direito e outra do lado esquerdo, o coração funciona como uma bomba, recebendo o sangue das veias e impulsionando-o para as artérias. Pela estrutura do lado direito circula o sangue venoso e pela do lado esquerdo, o sangue arterial.
Ao chegar até o coração, o sangue passa pelas válvulas mitral e tricúspide, onde é bombeado. Quando as válvulas são normais, nem a entrada e nem a saída do sangue produzem ruídos. Em casos de dificuldade de abertura ou fechamento das válvulas, os ruídos são detectados e recebem o nome de sopro.
A mesma coisa acontece com as válvula pulmonar e aórtica. Quando há uma obstrução, gera uma turbulência que produz ruído. Mas ele é bem baixinho e o nosso ouvido não consegue ouvi-lo.
Adeus à inocência
Nos recém-nascidos e crianças menores de seis meses de vida, no entanto, a atenção precisa ser redobrada. A detecção da alteração da ausculta cardíaca pode indicar distúrbio cardiovascular. Aproximadamente metade dos prematuros com peso de nascimento menor que 1,5 kg tem problemas nesse órgão vital. 'E quanto menor a faixa etária, maior é a urgência na investigação diagnóstica. As chances de ocorrência de cardiopatia são maiores', afirma o cardiologista Gustavo Foronda (SP), do Hospital Albert Einstein.
Embora menos comum, o sopro também pode ser patológico. E geralmente é causado por um defeito cardíaco que nasce com o bebê ou adquirido ao longo da vida, e necessitará de tratamento - que vai desde a simples prescrição de medicamentos até intervenções cirúrgicas. Os princípios físicos responsáveis pelo surgimento são os mesmos do inocente: ambos aparecem em decorrência do fluxo sangüíneo turbulento, o qual está relacionado a fatores como diâmetro do vaso sangüíneo, velocidade do fluxo e viscosidade do sangue, entre outros.
Segundo o cardiologista pediátrico Valdir Ambrósio Moisés, da Unifesp, a principal diferença é que o sopro inocente é um evento isolado, enquanto o patológico vem acompanhado de sintomas que estão associados às doenças cardíacas. Entre os mais comuns aparecem cansaço, cefaléia, cianose (coloração arroxeada nos lábios e nos dedos, diferente do roxo provocado pelo excesso de choro ou frio), dificuldade de ganho de peso, dificuldade alimentar (cansaço, engasgos, interrupção das mamadas), dor torácica, falta de ar (principalmente nas mamadas), palpitações, pneumonia de repetição e sudorese excessiva. 'Algumas crianças não apresentam sinais até a infância ou mesmo adolescência. Certas cardiopatias se tornam evidentes apenas com o crescimento e desenvolvimento do sistema cardiovascular', relata o especialista.
As doenças que mais freqüentemente atingem o órgão são as chamadas comunicação interventricular (cerca de 30%) e interatrial (cerca de 20%), também conhecidas por buraquinhos do coração. A primeira é facilmente diferenciada do sopro inocente porque o barulho é muito mais rude. Já na comunicação interatrial, que é um espaço aberto entre os dois átrios, o sopro é tão leve e suave como o inocente - o que torna a identificação pela simples auscultação um tanto difícil.
O que define o problema que está por trás do sopro patológico são os exames de radiografia de tórax, eletrocardiograma e ecocardiograma, que localizam o ruído, analisam o tipo de barulho e avaliam as características do órgão. 'Desta forma é possível perceber um buraquinho no coração por menor que ele seja. Por isso é necessária a avaliação cardiológica, mesmo na ausência de sopro', recomenda o cardiologista Edmar Santos.
Não existe maneira de prevenir o problema, mas há formas de evitar que ele se agrave. Com uma avaliação adequada do sistema cardiovascular é possível realizar o diagnóstico da maioria dos casos. E melhor: sem que os pais fiquem com o coração nas mãos.
EDMAR SANTOS, SOCIEDADE BRASILEIRA DE CARDIOLOGIA (SBC)
POR:POR ALEXSANDRA FARIAS
FOTO: FERNANDO GARDINAL
FONTE: Revista Viva Saúde
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Segundo o cardiologista Edmar Santos, da Sociedade Brasileira de Cardiologia (SBC), cerca de 80% dos pequenos têm algum tipo de sopro em um momento da vida. Isso não significa necessariamente que haja doença cardíaca por trás. A maior parte corresponde ao chamado sopro inocente, uma modificação da ausculta do coração que se apresenta em crianças saudáveis, em qualquer faixa etária, principalmente entre os seis meses e oito anos de idade, e na ausência de sintomas importantes de anormalidades no órgão. 'Qualquer ruído escutado com estetoscópio recebe o nome de sopro. Ele pode ser inocente ou patológico. O primeiro não traduz doença e tampouco causa problema ou dor. A pessoa leva uma vida normal, inclusive com atividades físicas regulares. Ocorre que o estetoscópio está cada vez mais sofisticado e capta tudo, inclusive a trajetória do sangue', explica.
O sopro cardíaco inocente é a causa mais freqüente de consultas cardiológicas em crianças. É auscultado em 50% a 80% das crianças normais durante toda a infância e adolescência. Na idade escolar, essa prevalência pode atingir números entre 75% e 90%. Sabe-se que ele é contínuo, tem curta duração, baixa intensidade, localiza-se em uma área pequena, varia conforme a respração e posição da criança e desaparece com o passar dos anos.
As origens ainda não são claras. 'Pode ser decorrente de uma variação no fluxo do sangue por causa de uma febre, anemia ou processos infecciosos. O coração dispara porque os vasos de dilatação ficam mais relaxados. Ele precisa manter a pressão e, para isso, tem que bater mais vezes para conseguir mexer esses vasos. A alteração da ausculta é normalizada com o controle desses quadros', afirma Edmar Santos. 'Também acontece devido ao tamanho do coração da criança, que é relativamente pequeno. O sangue acelera um pouquinho na hora que sai provocando uma turbulência, que pode ser percebida pelo estetoscópio. É um processo normal. A criança cresce, o coração fica no tamanho adequado e não produz mais ruído', esclarece Célia Maria Camelo Silva, coordenadora clínica do Setor de Cardiologia Pediátrica da Universidade Federal de São Paulo (Unifesp).
Cuidados na avaliação
Segundo os especialistas, a detecção de um sopro causa, quase sempre, muita angústia e ansiedade nos familiares, podendo levar a uma série de exames e encaminhamentos médicos desnecessários. Os dados da anamnese e do exame físico geral são fundamentais porque esclarecem para o pediatra se há indícios sugestivos de doença cardiovascular. 'Em casos de diagnóstico de sopro inocente duvidoso são indicados exames de radiografia de tórax, eletrocardiograma e ecocardiograma (ultra-som do coração)', afirma a ecocardiografista infantil Cláudia Regina Pinheiro Castro (SP), do Hospital São Luiz. 'O eco fornece dados mais precisos e detalhados da anatomia e do funcionamento do órgão quando comparado à radiografia de tórax e ao eletrocardiograma. Ele exclui as chances de cardiopatias, dando 100% de tranqüilidade para os pais. É a alta definitiva do cardiologista', avalia.
'Um dos principais cuidados que precisamos ter é dar segurança para a família. Mas há aquela mãe que ao ouvir o diagnóstico de sopro inocente vai à escola e faz um alarde dizendo que o filho é cardíaco. Infelizmente, esse comportamento é bastante comum. O resultado não poderia ser pior: cria-se uma criança indefesa e um adulto imaturo e despreparado para a vida', avalia a cardiologista Célia Maria.
Em alguns casos, é necessário repetir a ausculta cardíaca, que pode ser dificultada pela agitação, choro e pouca colaboração do pequeno. 'O procedimento na criança distingue-se do adulto, principalmente por causa das particularidades da caixa torácica (que é mais delgada) e da proximidade do coração com a parte anterior do tórax. Além disso, a freqüência cardíaca infantil é maior porque a fase é de constante crescimento e isso exige que o coração trabalhe em ritmo acelerado', diz a médica.
'Um dos principais cuidados que precisamos ter é dar segurança para a família. Mas há aquela mãe que ao ouvir o diagnóstico de sopro inocente vai à escola e faz um alarde dizendo que o filho é cardíaco. Infelizmente, esse comportamento é bastante comum. O resultado não poderia ser pior: cria-se uma criança indefesa e um adulto imaturo e despreparado para a vida', avalia a cardiologista Célia Maria.
Em alguns casos, é necessário repetir a ausculta cardíaca, que pode ser dificultada pela agitação, choro e pouca colaboração do pequeno. 'O procedimento na criança distingue-se do adulto, principalmente por causa das particularidades da caixa torácica (que é mais delgada) e da proximidade do coração com a parte anterior do tórax. Além disso, a freqüência cardíaca infantil é maior porque a fase é de constante crescimento e isso exige que o coração trabalhe em ritmo acelerado', diz a médica.
QUE BARULHO É ESSE?
O coração se localiza no meio do peito, ligeiramente deslocado para a esquerda. Ocupa no tórax a região conhecida como mediastino médio.
Constituído por duas estruturas separadas por um septo, uma do lado direito e outra do lado esquerdo, o coração funciona como uma bomba, recebendo o sangue das veias e impulsionando-o para as artérias. Pela estrutura do lado direito circula o sangue venoso e pela do lado esquerdo, o sangue arterial.
Ao chegar até o coração, o sangue passa pelas válvulas mitral e tricúspide, onde é bombeado. Quando as válvulas são normais, nem a entrada e nem a saída do sangue produzem ruídos. Em casos de dificuldade de abertura ou fechamento das válvulas, os ruídos são detectados e recebem o nome de sopro.
A mesma coisa acontece com as válvula pulmonar e aórtica. Quando há uma obstrução, gera uma turbulência que produz ruído. Mas ele é bem baixinho e o nosso ouvido não consegue ouvi-lo.
Adeus à inocência
Nos recém-nascidos e crianças menores de seis meses de vida, no entanto, a atenção precisa ser redobrada. A detecção da alteração da ausculta cardíaca pode indicar distúrbio cardiovascular. Aproximadamente metade dos prematuros com peso de nascimento menor que 1,5 kg tem problemas nesse órgão vital. 'E quanto menor a faixa etária, maior é a urgência na investigação diagnóstica. As chances de ocorrência de cardiopatia são maiores', afirma o cardiologista Gustavo Foronda (SP), do Hospital Albert Einstein.
Embora menos comum, o sopro também pode ser patológico. E geralmente é causado por um defeito cardíaco que nasce com o bebê ou adquirido ao longo da vida, e necessitará de tratamento - que vai desde a simples prescrição de medicamentos até intervenções cirúrgicas. Os princípios físicos responsáveis pelo surgimento são os mesmos do inocente: ambos aparecem em decorrência do fluxo sangüíneo turbulento, o qual está relacionado a fatores como diâmetro do vaso sangüíneo, velocidade do fluxo e viscosidade do sangue, entre outros.
Segundo o cardiologista pediátrico Valdir Ambrósio Moisés, da Unifesp, a principal diferença é que o sopro inocente é um evento isolado, enquanto o patológico vem acompanhado de sintomas que estão associados às doenças cardíacas. Entre os mais comuns aparecem cansaço, cefaléia, cianose (coloração arroxeada nos lábios e nos dedos, diferente do roxo provocado pelo excesso de choro ou frio), dificuldade de ganho de peso, dificuldade alimentar (cansaço, engasgos, interrupção das mamadas), dor torácica, falta de ar (principalmente nas mamadas), palpitações, pneumonia de repetição e sudorese excessiva. 'Algumas crianças não apresentam sinais até a infância ou mesmo adolescência. Certas cardiopatias se tornam evidentes apenas com o crescimento e desenvolvimento do sistema cardiovascular', relata o especialista.
As doenças que mais freqüentemente atingem o órgão são as chamadas comunicação interventricular (cerca de 30%) e interatrial (cerca de 20%), também conhecidas por buraquinhos do coração. A primeira é facilmente diferenciada do sopro inocente porque o barulho é muito mais rude. Já na comunicação interatrial, que é um espaço aberto entre os dois átrios, o sopro é tão leve e suave como o inocente - o que torna a identificação pela simples auscultação um tanto difícil.
O que define o problema que está por trás do sopro patológico são os exames de radiografia de tórax, eletrocardiograma e ecocardiograma, que localizam o ruído, analisam o tipo de barulho e avaliam as características do órgão. 'Desta forma é possível perceber um buraquinho no coração por menor que ele seja. Por isso é necessária a avaliação cardiológica, mesmo na ausência de sopro', recomenda o cardiologista Edmar Santos.
Não existe maneira de prevenir o problema, mas há formas de evitar que ele se agrave. Com uma avaliação adequada do sistema cardiovascular é possível realizar o diagnóstico da maioria dos casos. E melhor: sem que os pais fiquem com o coração nas mãos.
Males mais comuns na infância
EDMAR SANTOS, SOCIEDADE BRASILEIRA DE CARDIOLOGIA (SBC)
POR:POR ALEXSANDRA FARIAS
FOTO: FERNANDO GARDINAL
FONTE: Revista Viva Saúde
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