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23 de jan. de 2012

Nicolelis promete surpreender cientistas com avanços na neurociência

'Novas descobertas vão surpreender até cientistas da área', diz Nicolelis

adaptado de: http://revistagalileu.globo.com/Revista/Common/0%2c%2cEMI284681-17770%2c00.html

Mais reconhecido cientista brasileiro fala sobre os avanços e desafios de seu robô movido a impulsos cerebrais.Sua pesquisa sobre interface cerebro maquina é comparada à odisséia espacial travada em tempos onde não se acreditava que o homem era capaz de tal feito!

por Tiago Mali
Editora Globo
Miguel Nicolelis explica o que falta para nosso cérebro controlar outros equipamentos
Foram sete horários remarcados até conseguirmos conversar sem interrupções com o cientista mais reconhecido do Brasil, numa noite de quinta-feira, às 20h30. Estava em rápida passagem por São Paulo dando palestras. Nos dias anteriores, em Brasília. Depois, nos Estados Unidos, e no Instituto de Neurociências em Natal.


“É difícil parar quieto”, comentou uma de suas assessoras. Viagens, encontros com políticos, empresários, médicos e pesquisadores de várias partes do mundo estão atrelados ao grande objetivo de sua vida: o projeto Walk Again. Nicolelis está criando uma rede de colaboradores com mais de 100 especialistas para construir um exoesqueleto robótico comandado diretamente pelo cérebro que poderá fazer com que pessoas paralisadas voltem a andar. Se conseguir, pode ser o primeiro passo da ciência rumo a um futuro comandado por ondas cerebrais. Na entrevista abaixo, ele conta o que já está sendo feito e quais são as perspectivas de que um protótipo seja lançado até a Copa de 2014.




Qual é o atual estágio das próteses que usam interfaces entre homem e máquina?
Surpreendentemente, já temos muita coisa. A gente pensa que isso é uma área do futuro, mas existem muitas tecnologias sofisticadas já usadas hoje por dezenas de milhares de pacientes. O de cóclea, por exemplo, fez muita gente no mundo inteiro pudessem adquirir um grau de audição que os permitem funcionar na sociedade. Há ainda outros, como a estimulação profunda do cérebro [que envia impulsos elétricos aos neurônios contra o mal de Parkinson], em que os pacientes estão respondendo bem. A tendência é que isso só aumente.



Algumas das próteses de última geração usam impulsos nervosos dos músculos. Você pesquisa isso com implantes cerebrais.
São dois caminhos que competem pela solução. Quando você vai no nervo periférico, o sinal e o controle já foi dividido entre os membros. Nem sempre isso permite uma prótese funcional. Há casos de pacientes amputados nos quais às vezes você não consegue recuperar alguns dos nervos, que são destruídos durante o processo e amputação traumática. Por isso desde o começo, há 12 anos nessa área, eu e outros colegas propusemos que você teria de fazer isso a nível central, porque lá no cérebro, no córtex, os sinais ainda estão lá, não foram divididos. O acesso que você tem a esses sinais lá é mais fácil do que ir atrás dos nervos.



Não é perigoso colocar um chip dentro do cérebro?
A cirurgia de implante é até que trivial porque precisa ir apenas alguns milímetros dentro do córtex, a camada mais superficial do cérebro. A questão toda é a biocompatibilidade desses eletrodos, se eles irão sobreviver durante vários anos. Experimentos em macacos mostram que a gente pode, sim, implantar e registrar esses sinais com algumas centenas de células já começar a reproduzir comportamentos motores bem importantes. A nossa ideia é que com alguns milhares de células registradas — isso depende de uma tecnologia que vai chegar agora nos próximos anos — a gente vai ter a capacidade de reproduzir movimentos corpóreos fundamentais. A precisão que se obteve com os membros até agora é uma precisão muito pequena, e é um trabalho muito grande para o paciente utilizar essas interfaces periféricas, mas é possível que no futuro você tenha modelos híbridos, que tiram vantagem, dependendo do tipo de lesão, das duas possibilidades. O problema também dos nervos periféricos é que em lesões medulares altas não sobra nenhum sinal trafegando pelos nervos, então fica complicado.




Como decodificar os sinais de vários neurônios ao mesmo tempo?
O cérebro em si, tem estimados 100 bilhões de neurônios. A primeira grande surpresa desses trabalhos todos foi que você podia obter alguns resultados interessantes com algumas centenas deles. A questão de aumentar o número de neurônios é basicamente uma questão de engenharia. Não é mais uma questão científica, é uma questão tecnológica, que está começando a ser desenvolvida com a criação de eletrodos de alta densidade, como os que a gente desenhou no nosso laboratório. Mas isso não é o maior obstáculo, eventualmente vão ser solucionadas as questões tecnológicas, porque existe uma demanda muito grande para a solução delas.

Veja também:
Qual é o maior obstáculo?
A questão fundamental é como ler esses sinais e o que fazer deles. Você precisa ter um mínimo de entendimento sobre o sistema para conseguir reproduzir ele. Isso que é o grande fator limitante. Além do que, você tem outro problema de engenharia muito grande, muito complicado, que é criar um corpo robótico novo. Porque esse corpo tem que dar sustentação ao corpo que não consegue se sustentar, tem que proteger o corpo, tem que permitir no corpo que os comportamentos motores sejam realizados sem nenhum risco para os pacientes. E estamos realmente só no começo. A primeira versão desse exoesqueleto não vai resolver completamente essas questões, vai oferecer soluções iniciais. Mesmo assim, acho que o avanço vai ser muito importante. Porque, para começar, isso vai estimular as pessoas a imaginar que isso é possível.


Em que estágio está a pesquisa do Walk Again?
Tem várias coisas que vão ser divulgadas brevemente, descobertas que vão ser publicadas nos próximos meses que vão ser surpreendentes. Eu não posso falar delas agora porque esse trabalho ainda está sendo revisado, mas posso garantir que quando os dados novos que nós temos forem publicados, vai ser uma surpresa grande mesmo para as pessoas que trabalham na área. Ao mesmo tempo, em paralelo, há um trabalho de engenharia muito desafiador que está sendo feito por parceiros nossos no mundo inteiro. A intensidade desse trabalho deve aumentar a partir do começo de 2012. Vamos ter que dedicar um esforço muito grande na confecção e na ligação desse exoesqueleto.



E os testes?
Só vamos realizar as demonstrações que nós temos planejados, caso ela tenha sido demonstrado categoricamente que seja seguro e que tenha um benefício muito grande para os pacientes. Isso tudo é um processo que seria, se a gente parasse para pensar num planejamento acadêmico, um projeto para 10 anos. Mas eu acho importante que a gente acelere. Isso porque o benefício que ele pode gerar é tão grande que é importante que a gente demonstre a viabilidade dele.



Nessas novas descobertas a serem publicadas já há testes com humanos?
Tudo corre em paralelo. Os resultados que eu to falando envolvem trabalhos que já foram feitos em pacientes tanto no Brasil quanto dos Estados Unidos que são relatados agora, são trabalhos de registro intra-operatórios. Nós construímos uma causuística muito grande com quase 40 pacientes ao longo dos anos que nós estudamos em neurocirurgias. Um número pequeno no Brasil, 12, um número maior, 28, nos Estados Unidos. Mas a experimentação animal não para. Mesmo porque as primeiras demonstrações com o exoesqueleto vão ser testadas em animais.



Quantos pesquisadores estão envolvidos no Walk Again?
Nós temos pesquisadores em 3 continentes. Há gente na Alemanha, na Suíça, nos Estados Unidos e aqui no Brasil. Temos mais de 100 cientistas de diferentes áreas: robótica, ciências da computação, neurociência, cirurgia... Nós estamos constituindo 2 novos institutos multidisciplinares em Natal que também devem ser anunciados brevemente pra dar conta da demanda de trabalho que nós vamos ter. Estamos também trazendo vários pesquisadores do exterior para trabalhar conosco, arregimentando talentos no Brasil em várias áreas e a ideia é nos próximos meses seguir um cronograma de realizar experimentações em animais que são vitais e começar a fazer estudos clínicos. É um projeto que eu costumo chamar de Brazilian Moonshot, o “tiro a Lua brasileiro”, porque em complexidade ele é comparável a levar alguém para outro planeta.



Dá mesmo pra conseguir até 2014?
Nós estamos com um prazo muito exíguo, né? Evidentemente, a metáfora que eu uso da Copa do Mundo, se a gente precisar fazer isso na Olimpíada, dois anos depois, não tem problema. O importante é atingir a meta. Eu quero muito poder chegar na Copa do Mundo e fazer uma demonstração e vamos colocar todo o empenho para isso. Mas isso não vai estar acima dos critérios científicos, de segurança, critérios clínicos para a coisa seja bem feita. Não vai ser a coisa final, porque vai evoluir muito depois disso, mas acho que dá para demonstrar claramente o potencial científico de se fazer um projeto desse tamanho no Brasil.



Os novos centros de Natal são para quê?
Vão ser centros multidisciplinares em áreas complementares à neurociência, mas muito mais voltadas a tecnologia de ponta. E o que a gente chama de estudos avançados. A primeira missão, com o instituto de neurociências em Natal vai ser voltada à área de tecnologia assistida. Mas a ideia é que esses centros desenvolvam sua própria identidade?



Como está essa divisão de responsabilidades do projeto?
A parte robótica está sendo feita pela equipe do professor Gordon Sheng, da Universidade Técnica de Munique. A parte de ciências da computação, avatares e ambientes virtuais ta sendo feita na Escola Politécnica federal de Lausanne, na Suíça. A parte de experimentos animais e de neurotecnologia está sendo feita no meu laboratório na Duke Univesity e vamos trazer partes desses experimentos neurotécnológicos para os campus do cérebro do instituto de neurocências de Natal.



Isso vai trazer mais projeção para o instituto.
A nossa ideia é que o Walk Again seja uma grande âncora do projeto da cidade do cérebro lá de Macaíba, não só em relação à pesquisa básica, mas também para alavancar um parque neurotecnológico que eu gostaria de construir.



Quais são os benefícios locais do projeto?
É muito parecido com o que aconteceu quando o ITA foi criado em relação a aeronáutica.Hoje temos a Embraer e outras empresas por conta disso. São José dos Campos é um grande exemplo do que esse tipo de ideia pode gerar. São produtos que vão contribuir para uma nova formação de uma academia, de uma nova sociedade e formação em termos de recursos humanos.



E para o Brasil?
O projeto Walk Again não é só voltar a andar, criar uma tecnologia assistida. Ele vai ser cercado de outros desenvolvimentos tecnológicos. Nós temos a chance de introduzir aqui no Brasil, por exemplo, uma nova terapia para a doença de Parkinson que ta se mostrando eficaz em estudos preliminares em macacos e seres humanos. Além disso, queria fazer do projeto Walk Again, um grande projeto educacional e científico, para estimular que as crianças da rede pública e privada se sintam co-proprietárias desse projeto. A gente quer que as crianças possam se ligar ao projeto, participar de decisões de assuntos científicos. Isso seria muito importante para a juventude brasileira em termos de autoestima.



Como o governo vai participar disso?
Tem parcerias, mas eu ainda não posso anunciar, que são anúncios oficias. Estamos em converasas constantes com o Ministério da Ciência e Tecnologia, o da Educação e o Ministério da Saúde. As conversas estão bem adiantadas. Estou muito otimista quanto a isso. Mesmo porque, se a gente demorar muito, não vai dar tempo.

Acidente na BR 135 deixa 4 mortos em Montes Claros

Acidente na BR 135 deixa 4 mortos e vários feridos:

adaptado:http://www.cisrun.saude.mg.gov.br/

Cena perigosa de acidente vira pesadelo !


Por volta da 8h50 deste sábado, 21/01, equipes de resgate do SAMU-192 Macro Norte atenderam a uma ocorrência de acidente na BR 135, em Montes Claros, próximo ao trevo na saída para Bocaiuva.

Dois caminhões colidiram frontalmente e um dos motoristas ficou preso às ferragens. Equipes do Samu e Corpo de Bombeiros foram acionadas para socorrer a vítima, que foi desencarcerada e, no momento em que era conduzida para a ambulância, ao atravessar a pista, um caminhão boiadeiro que vinha na pista contrária perdeu o controle, atravessou o canteiro e atingiu a equipe de resgate e curiosos que observavam a cena do acidente, saindo da pista.


Cerca de 10 pessoas foram atingidas pelo caminhão. Quatro delas morreram na hora, entre elas o soldado Claudionor Cordeiro da Silva, do Corpo de Bombeiros, que conduzia a vítima para a ambulância. O enfermeiro e o condutor da ambulância do Samu, que estavam juntos com o soldado do Corpo de Bombeiros, tiveram ferimentos leves.
Todo o efetivo da base do Samu em Montes Claros foi acionado para socorrer as vítimas, que foram levadas para hospitais da cidade, três delas em estado grave.


O Samu Macro Norte lamenta a morte do soldado Claudionor Cordeiro da Silva e se solidariza com a família e colegas do Sétimo Batalhão do Corpo de Bombeiros Militar de Montes Claros.

Autor: Jerúsia Arruda

Nicolelis versus Calligaris : neurociência e psicologia

DOIS NEURÔNIOS


adaptado de :http://revistatrip.uol.com.br/revista/205/reportagens/dois-neuronios.html

Miguel Nicolelis e Contardo Calligaris oferecem visões distintas sobre o futuro do homem . Mostrando o que as experiências vastas nos seus respectivos campos demonstra sobre as mudanças e o tempo que elas vão levar !
Texto por Rodrigo Vergara (com treportagem de Tatiana Achcar) Fotos Gabriel Rinaldi



Gabriel Rinaldi
Miguel Nicolelis, Ricardo Guimarães e Contardo Calligaris
Miguel Nicolelis, Ricardo Guimarães e Contardo Calligaris

Em um debate que abriu as comemorações de 5 anos de Prêmio Transformadores e 25 anos de Trip, o neurocientista Miguel Nicolelis e o psicanalista Contardo Calligaris ofereceram visões distintas e complementares sobre o futuro do homem

Uma troca de ideias entre o neurocientista Miguel Nicolelis e o psicanalista Contardo Calligaris marcou a abertura das comemorações dos 25 anos da revista Trip e dos cinco anos do Prêmio Trip Transformadores. A partir do tema “Evolução: como estaremos em 25 anos”, os dois conversaram por cerca de duas horas no último dia 24 de outubro, em São Paulo, na presença de mais de 200 convidados – que também puderam participar do batepapo, fazendo perguntas e comentários. A ideia era debater o futuro próximo do homem a partir de duas visões distintas, com duas mentes reconhecidamente brilhantes em seus respectivos campos.
Um dos homenageados do Trip Transformadores deste ano, Miguel Nicolelis está à frente, seja na Universidade de Duke (EUA) ou no Instituto de Neurociências de Natal (RN), de algumas das pesquisas mais avançadas do mundo relacionadas à nossa capacidade cerebral – incluindo interfaces entre homem e máquina que poderão reabilitar pacientes com paralisias. Já o psicanalista e escritor italiano Contardo Calligaris, colunista da Folha de S.Paulo, firmou-se como referência nacional na espinhosa tarefa de interpretar as emoções e as relações humanas.
A fluência da interação entre os dois foi estimulada pelo mediador Ricardo Guimarães, presidente da Thymus Branding, colunista da Trip e uma das vozes mais significativas que orbitam no universo desta revista há mais de uma década. Como você verá a seguir na edição dos principais momentos da conversa, rolou uma química entre o neurocientista e o psicólogo, entre o homem do cérebro e o da consciência.
Gabriel Rinaldi
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Miguel Nicolelis
O cérebro funciona em rede
[Nicolelis] Mesmo pilares da nossa organização política e social estão sendo questionados. E aí vem uma provocação: estão sendo questionados na direção de modelos organizacionais que lembram como o cérebro da gente funciona. Por exemplo, esse movimento sem hierarquia de ocupar Wall Street, lá não tem um líder que comanda o comportamento. Você tem um processamento distribuído, em que a representação dos indivíduos não se dá mais por intermediários, é quase representação direta.
Isso lembra muito o modo como funciona um circuito neural, em que não há um neurônio chefe, que determina o comportamento dos outros. Tudo é uma propriedade emergente, tudo emerge de um grupo. A grande maioria dos fenômenos naturais, inclusive os que emergem do nosso cérebro, é propriedade emergente, que surge da interação, é imprevisível. Depende de interações não lineares de muitos elementos.
É isso que está acontecendo mundo afora. Quando você vai a Madri e pergunta aos jovens por que eles estão na praça e quem é o líder deles, eles respondem: “Não temos líder, aliás nem sabemos bem por que estamos aqui, mas não queremos o que está aí, só não sabemos o que pôr no lugar”. Esse questionamento está acontecendo em todo o mundo e é algo imprevisível, não sabemos o que vai emergir disso.
Cultura imediatista
[Calligaris] “Não acho que vivamos numa época imediatista. Não acho os jovens especialmente imediatistas. Faz parte daquelas críticas frequentes ao mundo atual. No que diz respeito ao hedonismo, hoje somos uma civilização muito oposta aos prazeres, longe do que eram culturas hedonistas. Com o imediatismo ocorre algo parecido. Parece necessário lembrar aos pais que a gente vive no presente, e lembrar inclusive a nós mesmos. Estamos inseridos numa tradição cristã na qual a vida é uma prova. A recompensa virá se você merecer, mas só no fim dos tempos.
Somos uma cultura constantemente preocupada com quais serão as consequências futuras dos nossos atos. Então eu não identifico o imediatismo como um problema, pelo menos nos jovens que eu vejo. Mesmo os jovens que fumam, bebem, se drogam, acho eles extremamente prudentes, e acho ótimo que seja assim.
“Muitos pais se esquecem de que os adolescentes estão vivendo agora, não podemos considerá-los só como promessas de um futuro”
O que dizer aos jovens?
[Calligaris] “Fui por muito tempo terapeuta de adolescentes, então lidei muito com adolescentes e pais de adolescentes, mais ou menos desesperados. Nós adultos não paramos de pensar na adolescência como um longo tempo de formação, de pensar no futuro etc. Isso é ótimo, mas chegou um ponto em que muitos pais se esquecem de que os adolescentes estão vivendo agora, não podemos considerá-los só como promessas de um futuro.
É pesado, mas pergunto aos pais de adolescentes obcecados com isso de preparar os filhos para o futuro: “Deus não queira, mas, se o seu filho morresse hoje, você poderia dizer que fez o necessário para que a vida dele até aqui tenha valido a pena, independentemente da promessa com a qual você o sobrecarregava?” Essa questão deve estar conosco o tempo inteiro.
[Nicolelis] “O que eu diria para eles é muito simples: “Seja feliz, acredite no seu taco, namore muito. E seja palmeirense”, porque a vida não pode ser só prazeres, né? A dor também nos conduz. [risos]
Homem X Computador
Gabriel Rinaldi
TRIP205_Contardo_NicoV1-1
Contardo Calligaris
[Nicolelis] O amor, a paixão, para nós cientistas é um fenômeno não computável. Ou seja, não existe forma de você reduzir minha paixão por uma pessoa num algoritmo de computador e graduar a valência, intensidade ou mesmo descrever computacionalmente o que isso é. Estamos à procura de explicações biológicas de como o cérebro funciona, mas temos uma barreira que até agora ninguém conseguiu nem teoricamente cruzar. A maior gama de fenômenos humanos, as emoções, são fenômenos não computáveis. O que é ótimo, porque alguma coisa tem que ser segredo, não?
Um computador pode reproduzir uma minoria dos fenômenos naturais e mesmo dos processos industriais. Tem esse movimento da singularidade, que virou religião nos Estados Unidos, que diz que, em algumas décadas, seremos superados pelas máquinas. Mas ninguém diz como essa máquina pintaria o teto da Capela Sistina ou comporia uma sinfonia como Mozart ou faria um gol como Ademir da Guia.
Os caras que vendem isso estão vendendo uma ideologia de que o ser humano é substituível. Muita gente desmerecendo o que temos de mais precioso, a natureza humana, que é não computável, não reproduzível e única. Cada um de nós tem uma existência única no universo. Então, em vez de valorizar o que temos de mais precioso, estamos sucumbindo à propaganda de que somos substituíveis.”
Amor nos tempos modernos
[Calligaris] “Os últimos 20 anos produziram mudanças comportamentais extraordinárias. A internet mudou o comportamento amoroso sexual das pessoas de uma maneira absolutamente impressionante. Para alguém que começou a clinicar nos anos 70, é impressionante o progresso. Naquela época, se alguém tinha uma fantasia sexual minimamente torta, achavam que era um monstro, a única pessoa no mundo daquele jeito. Hoje a mesma pessoa com uma fantasia sexual muito mais complexa e torta sabe que mundo afora há grupos de centenas de pessoas que sentem como ele, e ele pode se comunicar etc. Provavelmente há muitos mais pedófilos que conseguem se conter graças à possibilidade de se expressar online do que havia antes. Isso sem contar a possibilidade do encontro que a internet produziu. O número de pessoas de 60 ou 70 anos que conseguem encontrar um parceiro ou parceira é incrível, não existia antes dos anos 2000.”
O sentido da vida
[Calligaris] “A ideia de que vida seja um valor absoluto é um conceito, uma ideologia completamente recente, higienista, provavelmente do século 19. Só hoje que você pergunta para as pessoas o que é mais importante e elas respondem ‘saúde’. Um homem do século 17 diria ‘honra’. Se perguntasse a ele se morreria pela honra, a resposta seria afirmativa. Considerar que viver vale a pena a qualquer preço é uma ideia moderna, contemporânea, nem sei quanto tempo ela vai durar.”
[Nicolelis] “Tem duas coisas universais na nossa espécie: a música e a necessidade de ter uma história de como tudo começou. Os pigmeus acreditam que veio uma corda do céu e foram descendo pigmeus pela corda. Essa é a história da criação para eles. Cada um acredita numa mitologia. A música é o segundo fator que é inerente, aparentemente, a qualquer grupo de humanos, mesmo tendo vivido isolado em ilhas. Eu gosto de fantasiar que essas duas coisas de alguma forma estão relacionadas, que existe correlação na necessidade de contar uma história e de expressar suas emoções, sua vida, em tons musicais.”
“Mandamos as correntes dos neurônios para um alto-falante e surgiu uma sinfonia que ninguém jamais ouviu”
Sinfonia do cérebro
[Nicolelis] “A música teve um sentido muito importante na minha carreira. A primeira grande descoberta de que eu participei, a primeira vez que a gente registrou a atividade de cem células cerebrais ao mesmo tempo, não dava pra ver, não tinha computador para isso, mas a gente ouviu. Mandamos as correntes elétricas dos neurônios de um macaco para um alto-falante e ligamos. De repente surgiu uma sinfonia que ninguém jamais tinha ouvido. Foi o momento mais singular da minha carreira científica virar aquele botão e ouvir um cérebro, que estava na minha frente, acordado, olhando pra mim e tocando. Esse cérebro era de uma primata, minha grande Aurora, com quem eu passei mais tempo do que com meus três filhos.
Ela ia mover a mão, olhando para um objeto, mas a sinfonia do cérebro de ela me disse para onde ela ia mover a mão e a que velocidade, antes de ela começar o movimento, olhando pra mim. Ouvi o cérebro dela antes de ela realizar o movimento. Naquele milissegundo eu sabia para onde ela ia mover a mão. Foi o grande insight da minha carreira. E todo mundo em volta também viu e percebeu. E, apesar de ser um som que nenhum de nós conhecia, todo mundo sabia o que significava.”
O caos da evolução
Gabriel Rinaldi
Miguel Nicolelis
Miguel Nicolelis
[Nicolelis] “Imagine a vida da nossa espécie ou de qualquer um de nós como uma fita cassete. Se você rebobinasse essa fita até o começo da evolução da nossa espécie e soltasse a fita de novo, certamente nada do que aconteceu ia acontecer de novo. A chance de o processo evolutivo produzir a mesma sequência de eventos que nos traria nesta noite aqui é zero. Cada um de nós é uma epopeia, um romance único, um épico que jamais se repetirá.”
Libertação do cérebro
[Nicolelis] “Estamos testemunhando o começo da libertação do nosso cérebro dos limites físicos do nosso corpo. Nossa ação mental certamente não vai ser limitada pelo limite físico. O limite do nosso senso de ser não vai ser mais a última camada de epitélio. Num laboratório de experimentação de neurociência, eu posso te dar a sensação de que você está caminhando num ambiente em outro corpo, real ou virtual. E você em 5 min vai ter a sensação de que aquele corpo é o seu, não o seu real. Essa é uma ilusão visual-tátil que foi descoberta recentemente, uma ilusão que pode ser simulada muito facilmente e que demonstra quão frágil, dinâmica e fluida é essa associação com nosso corpo, apesar de termos tanta segurança de assumir que esse corpo é o nosso eu.”
Download de memória humana
[Nicolelis] “A natureza é muito pródiga em achar soluções ótimas para problemas. Mas ela tem um raro momento de desperdício. Quando cada um de nós expira, vai com a gente a narrativa desse épico único que foi nossa vida. Não há como, nem escrevendo uma autobiografia, deixar um relato fidedigno do que foi essa experiência única, emoções únicas, a vivência única. Essas percepções não são relatadas no fim da nossa vida.
Um dos meus grandes sonhos de futuro, mas num distante futuro, é que, ao término das nossas vidas, pudéssemos deixar como legado um registro eletroencefalográfico da nossa experiência, para que gerações futuras ou espécies que sigam a nossa pudessem colocar isso no iPod deles e entender precisamente o que foi a experiência humana, ouvindo a experiência de uma vida ou de muitas vidas humanas relatadas sem os filtros de linguagem, os filtros naturais que cada um de nós impõe para contar os aspectos da sua vida. Seria um enorme legado para o universo da nossa espécie. É capaz de acontecer, é tecnologicamente possível de conceber que daqui a alguns milhares de anos isso seja possível.”
O que é a felicidade
[Calligaris] “Eu não me interesso pela felicidade. Fiz essa opção muito tempo atrás. Se eu quisesse ser feliz, teria tomado as providências necessárias e estaria injetando heroína duas vezes ao dia, de manhã e à noite. Minha vida se encurtaria, mas isso não teria grande importância para mim. Eu seria propriamente feliz. Por ter trabalhado com heroinômanos que usam heroína injetável, garanto que eles são felizes. Digo isso de maneira um pouco irônica porque a indústria farmacêutica se apoderou desse conceito. Está vendendo falsas pílulas da felicidade, enquanto a única que funciona é a heroína, que ela não vende. Ainda [risos].
O que me interessa sim, muito, é ter uma vida interessante. Uma vida interessante inclui viver plenamente um monte de momentos infelizes. Nos anos 90 eu estava nos Estados Unidos, atendia lá. Foi quando saiu o primeiro grande livro sobre o Prozac. E você recebia pedidos bizarros! Tipo: ‘Meu pai foi diagnosticado com câncer. Ele tem dois anos para viver. Não estaria na hora de eu começar a tomar Prozac? Porque eu não quero ter esse negócio de luto quando ele morrer’.
“Se ser feliz é renunciar à variedade das experiências altas e baixas, então não quero ser feliz”
Eu acho que não. Quando o pai da gente morre, a gente tem que sofrer, isso significa viver plenamente e de maneira interessante. Eu não quero renunciar a essa experiência, até porque só vou tê-la uma vez. Se ser feliz é renunciar à variedade das experiências altas e baixas, que incluem sofrimentos, quando se perde um ente querido, alguém me deixa ou meu filho está doente, então não quero ser feliz.
A incapacidade dos adultos de tolerarem que um menino de 5, 6 ou 7 anos possa ser triste é um negócio assombroso e que produziu e produz um uso abusivo de medicação psiquiátrica contra a criança. Pensar “meu filho tem que ser feliz e portanto quando está triste eu o levo ao psiquiatra e forço o psiquiatra a lhe dar um remédio para o qual nem estava previsto o uso pediátrico, nem foi usado e experimentado para o uso pediátrico, sem ter ideia dos efeitos que vai ter”, eu acho isso um horror.”
[Nicolelis] “A felicidade pra mim é criar uma razão pela qual você quer acordar de manhã, sair da cama, enfrentar todo o rol de absurdos que temos que enfrentar para sobreviver, para continuar fazendo o que a gente faz.
Gabriel Rinaldi
Contardo Calligaris
Contardo Calligaris
A primeira missão do nosso sistema educacional deveria ser libertar a felicidade interior de nossas crianças. Possibilitar que essas crianças se sintam capacitadas e livres pra exercer sua imaginação, seu poder criativo e seu poder transformador da sociedade, ou seja, ‘eu sim posso mudar o mundo’. Isso devia ser a primeira pauta, meta, de qualquer sistema educacional. Não fazer prova, vestibular, avaliar, medir quantas vezes eu consigo reproduzir os bytes que meu professor colocou para mim, e na prova eu vomito tudo que ele falou de volta como sendo verdade.
A felicidade é a libertação do intelecto individual e coletivo em buscar a crença de que nessa passagem curta por esse mundo nós somos sim capazes de tomar o destino das nossas vidas nas nossas mãos e transformar o mundo. Para mim é essa definição de felicidade.”
O futuro será melhor
[Calligaris] “O mundo de hoje é muito melhor do que o mundo de 25 anos atrás. De muitos pontos de vista, quase todos. Então, talvez a gente possa contar com o fato de que o mundo daqui a 25 anos será melhor do que o mundo de hoje.”
[Nicolelis] “Apesar de todos os nossos preconceitos, vícios e pequenos desvios tropicais, acredito que o mundo vai ser melhor. E um mundo melhor curiosamente tem uma grande chance de emergir daqui [do Brasil], um lugar que, há 25 anos, a gente não acreditava que ia ser a grande esperança da humanidade. Eu literalmente acredito que abaixo do equador existe muita coisa que vai mudar o mundo nos próximos 25 anos.”
Agradecimento: Coelho da Fonseca

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